domingo, 23 de março de 2008

Querias que escrevesse o que senti ao rever-te, que deixasse cair como ainda te quero e me arrepanho e derramo no teu olhar lacustre, mas não, desculpa. Esperas que eu te vá escoando através de palavras mansas,porque nelas te bastas e nos desbastas, mas não, lamento. Nem penses que te contarei como me contorci os tornozelos sóbrios na vontade ébria de me roçar ao de leve no canto direito da tua boca e desengana-te, se vens à procura do que não te pude dizer, porque tu não deixas (nunca deixas) e eu não quero (às vezes, quero). Também não te direi que só quando te vi percebi como tinha de facto saudades, e que as saudades que andei a dizer-te que tinha eram mentira, pois delas não fazia a mínima ideia, nem sequer sabia que as evocava como mero remate de breves despedidas por escrito. Gostarias que te descrevesse como esta noite me agarrei à almofada, náufraga por fim em terra firme, que a pus entrepernas como fazem as crianças com medo do escuro e que, depois, a atirei para os pés, espreguiçando-te para fora da cama, escoiceando para o chão os lençóis suados que quereria encharcados do teu esforço anaeróbico sobre o riso do meu umbigo. Querias que te abrisse os meus desejos cerrados como às vezes te abro com raiva as minhas pernas (reumáticas, atrofiadas, gangrenadas e cobertas de varizes em forma de afluentes parados, como as que surgem na velhice da espera).


Este texto foi retirado do meu blog favorito - http://www.umamoratrevido.blogspot.com
Escrito por Sofia Vieira

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